quinta-feira, 15 de abril de 2010

A Cúpula de Segurança Nuclear

Pio Penna Filho*

Volto essa semana a analisar o mesmo tema do artigo anterior, só que agora acrescido de novas informações e no momento em que vários países se reúnem em Washington para discutir formas de tentar garantir que armas, ou material nuclear, não caiam em mãos de grupos terroristas. A Cúpula de Segurança Nuclear também se ocupa, é claro, com a questão da não-proliferação nuclear mesmo entre atores estatais.
Para início da nossa análise é interessante notar qual está sendo a postura adotada por aqueles que já possuem armas nucleares. Embora as maiores potências nucleares (Estados Unidos e Rússia) tenham firmado um acordo de redução de estoques recentemente, nenhuma das duas admite abrir mão completamente dos seus arsenais. Mesmo considerando a importante redução em um terço dos estoques, ainda haverá armas suficientes para comprometer a vida no planeta caso uma desgraça ocorra.
O presidente da França, outra grande potência atômica, anunciou que o seu país também não abrirá mão do “direito” de manter o seu arsenal nuclear, mesmo que reduzido. Segundo ele, trata-se de uma questão de segurança nacional. Ou seja, para os franceses se sentirem seguros nesse mundo “tão perigoso como o que vivemos hoje”, a França precisa de armas nucleares. No mesmo caminho seguem os chineses e os britânicos, as outras grandes potências.
Considerando essa postura somos obrigados a alguns questionamentos: será o mundo inseguro apenas para esses países? O que lhes dá o direito de manterem arsenais nucleares enquanto o resto do mundo deve abrir mão, espontaneamente ou não, de desenvolverem capacidade semelhante? Voltamos, assim, ao ponto de partida, qual seja, a idéia de congelamento do poder mundial.
O que esses países querem nada mais é do que manter para si a capacidade de ameaçar os outros com suas terríveis armas nucleares sem que ninguém possa, por sua vez, dissuadir essa ameaça. Se estivessem sendo sinceros eles também deveriam se comprometer seriamente na eliminação total de qualquer ameaça nuclear, ideal que só será conquistado quando não houver mais armas nucleares em nenhum país do mundo. Esse é, portanto, o ideal a ser perseguido.
Mas a questão nuclear não se encerra nos arsenais militares. Há um temor, e bem fundamentado, de que as grandes potências também desejam impedir ou dificultar ao máximo que os outros países consigam desenvolver tecnologias próprias no campo nuclear para fins pacíficos. Na verdade, nem se trata de um “temor”, mas sim de uma constatação. Há muito pouca cooperação no campo nuclear entre os países que completaram o ciclo e aqueles que não o conseguiram, mesmo quando pensamos em termos de geração de energia ou da aplicação nuclear nos campos da medicina e da indústria, por exemplo.
É nessa perspectiva que segue o discurso do Brasil na Cúpula. A China também tem uma posição muito próxima. Em síntese: O Brasil defende uma desnuclearização ampla e se coloca ao lado dos Estados Unidos a favor de uma frente ampla contra o terrorismo nuclear mas, ao mesmo tempo, defende que não se pode, em nome de uma guerra contra o terror, aliás muito mal definida, impedir que qualquer país possa vir a desenvolver tecnologias nucleares para qualquer finalidade que não a bélica.


* Professor do Instituto de Relações Internacionais da USP e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário